FOTO: AGÊNCIA O GLOBO |
A ABL decretou luto oficial de três dias em homenagem ao escritor. Corpo de Scliar será enterrado hoje
Porto Alegre Morreu na madrugada de ontem o escritor gaúcho e imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL) Moacyr Scliar. Vítima de falência múltipla dos órgãos, ele tinha 73 anos e estava internado havia mais de um mês no Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Em 11 de janeiro, o escritor deu entrada no hospital para a retirada de pólipos do intestino. Cinco dias mais tarde, ele sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) e teve de passar por nova cirurgia. No início de fevereiro, o quadro se agravou, com uma infecção respiratória.
O velório de Scliar aconteceu, ontem, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre. A esposa do escritor, Judith Scliar recebeu os cumprimentos de familiares, autoridades e amigos.
O corpo do escritor será enterrado, hoje, em cerimônia reservada para parentes e amigos.
Em nota, a presidente Dilma Rousseff lamentou a morte de Scliar. Para Dilma, o escritor foi um "ícone da literatura gaúcha, brasileira e latino-americana".
"Ele representou nossa sociedade em diversos gêneros literários, sem perder de vista sua condição de filho de imigrantes e sua formação médica. É com tristeza que nos despedimos desse mestre da nossa literatura", completa Dilma.
O presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, o deputado Adão Villaverde, também lamentou a morte do amigo. "Perdemos um símbolo de cultura e de humanidade neste domingo".
Homenagem
A Academia Brasileira de Letras (ABL) decretou luto oficial de três dias por causa da morte de Scliar. O escritor ocupava desde 2003 a cadeira de número 31 da Academia.
"Moacyr foi um trabalhador literário incansável, um ser humano agradabilíssimo que nos vai fazer muita falta", afirmou o presidente da ABL, Marcos Vinicius Vilaça.
Vencedor de três prêmios Jabuti, em 1988, 1993 e 2009, Scliar escreveu mais de 70 livros, entre contos, crônicas, ensaios e romances. O escritor também recebeu o Prêmio Casa de las Américas, em 1989, e o Prêmio José Lins do Rêgo, concedido em 1998 pela ABL.
A opinião do especialista
Lembranças
No fim de maio de 2004, fui avisado por uma das coordenadoras da Bienal Internacional do Livro do Ceará, que havia sido escolhido para dialogar com Moacyr Scliar. Por que eu? João, deixe de conversa, será sexta-feira, dia 3, às 19 horas. Um beijo, e desligou. Fiquei matutando e lembrei que tinha lido, uma pequena coleção chamada de "Vozes do Golpe", da Cia. das Letras, e que um desses pequenos e preciosos quatro livros, era "Mãe Judia", 1964, de Moacyr Scliar.
Certamente, o exercício a que se propôs Scliar foi prova de sua reconhecida capacidade de transposição do real para o imaginário. Relembrei de seus livros "O Exército de um homem só", "Max e os Felinos" e, certamente, de "O Centauro e o Jardim", entre outros. E claro, de suas sarcásticas crônicas, às segundas feiras, na página 2 do caderno Cotidiano, da Folha de São Paulo.
Encabulado, liguei para a casa dele. Era fim de tarde. Ele estava em meio a uma entrevista e falamos rapidamente. Disse, de saída, a verdade. Era um mero escrevinhador amador de província. Ele respondeu rápido e foi retomar a sua entrevista. Scliar era cobra criada e uma bienal a mais não faria diferença para ele. Para mim, sim, pois estava tratando com um ficcionista do tamanho dos pampas e experiência literária a causar inveja a qualquer escritor latino americano.
Traduzido em espanhol, inglês, alemão, holandês, sueco, francês e hebraico, ganhara prêmios que dariam para tornar célebres muitos escritores. Um escritor para cada prêmio. Os prêmios eram: Joaquim Manoel de Macedo, Érico Veríssimo, Cidade de Porto Alegre, Guimarães Rosa, Brasília, Jaboti(3), Associação Paulista de Críticos de Arte, Casa de Las Américas, em Cuba, Pen Clube do Brasil, e José Lins do Rego. E eu metido com ele. Imaginem a minha perturbação.
Resolvi, de forma audaciosa, mandar um livro meu por Sedex e, após três dias, ligo novamente. Ele ainda não havia recebido. Falei da minha apreensão sobre o nosso então futuro diálogo. Scliar disse que não carecia de me preocupar. E eu tremendo de medo. Chegada a hora consegui fazer a Travessia. Penso que até o afaguei. Dia seguinte, manhã cedo, estava a fazer Cooper e, acidentalmente, encontro com ele. Éramos apenas homens de tênis, calção e camiseta. Nada mais que isso. Conversamos, soltos.
Ontem, domingo, 27, ouço, pelo rádio, que Scliar acabara de morrer. Lamentei e lembrei que sua história pode ser sumariada assim: Seus pais vieram da Besarábia para trabalhar em um projeto de colonização agrícola no interior do Rio Grande do Sul. Ocorreu que o projeto estava no fim e eles mudaram para Porto Alegre, onde Scliar nasceu, em 1937.A família morava no Bom Fim, bairro de imigrantes, e Scliar foi estudar, em 1943, na Escola Iídiche. Em 1948, Scliar é transferido para o Colégio católico Rosário Menino. Depois, formou-se e exerceu a Medicina comunitária. A partir de 68, surge o escritor com "O Carnaval dos Animais" e não parou. Foram quase 80 publicações, entre romances, novelas, contos, ficção juvenil e ensaios. Ontem, 27, ouço pelo rádio que Scliar morrera. Desaparece um grande escritor nacional e fica aberta vaga na Academia Brasileira de Letras. Descanse em paz.
João Soares Neto
Escritor e membro da Academia Cearense de Letras
Fonte: Diário do Nordeste
Porto Alegre Morreu na madrugada de ontem o escritor gaúcho e imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL) Moacyr Scliar. Vítima de falência múltipla dos órgãos, ele tinha 73 anos e estava internado havia mais de um mês no Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Em 11 de janeiro, o escritor deu entrada no hospital para a retirada de pólipos do intestino. Cinco dias mais tarde, ele sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) e teve de passar por nova cirurgia. No início de fevereiro, o quadro se agravou, com uma infecção respiratória.
O velório de Scliar aconteceu, ontem, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre. A esposa do escritor, Judith Scliar recebeu os cumprimentos de familiares, autoridades e amigos.
O corpo do escritor será enterrado, hoje, em cerimônia reservada para parentes e amigos.
Em nota, a presidente Dilma Rousseff lamentou a morte de Scliar. Para Dilma, o escritor foi um "ícone da literatura gaúcha, brasileira e latino-americana".
"Ele representou nossa sociedade em diversos gêneros literários, sem perder de vista sua condição de filho de imigrantes e sua formação médica. É com tristeza que nos despedimos desse mestre da nossa literatura", completa Dilma.
O presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, o deputado Adão Villaverde, também lamentou a morte do amigo. "Perdemos um símbolo de cultura e de humanidade neste domingo".
Homenagem
A Academia Brasileira de Letras (ABL) decretou luto oficial de três dias por causa da morte de Scliar. O escritor ocupava desde 2003 a cadeira de número 31 da Academia.
"Moacyr foi um trabalhador literário incansável, um ser humano agradabilíssimo que nos vai fazer muita falta", afirmou o presidente da ABL, Marcos Vinicius Vilaça.
Vencedor de três prêmios Jabuti, em 1988, 1993 e 2009, Scliar escreveu mais de 70 livros, entre contos, crônicas, ensaios e romances. O escritor também recebeu o Prêmio Casa de las Américas, em 1989, e o Prêmio José Lins do Rêgo, concedido em 1998 pela ABL.
A opinião do especialista
Lembranças
No fim de maio de 2004, fui avisado por uma das coordenadoras da Bienal Internacional do Livro do Ceará, que havia sido escolhido para dialogar com Moacyr Scliar. Por que eu? João, deixe de conversa, será sexta-feira, dia 3, às 19 horas. Um beijo, e desligou. Fiquei matutando e lembrei que tinha lido, uma pequena coleção chamada de "Vozes do Golpe", da Cia. das Letras, e que um desses pequenos e preciosos quatro livros, era "Mãe Judia", 1964, de Moacyr Scliar.
Certamente, o exercício a que se propôs Scliar foi prova de sua reconhecida capacidade de transposição do real para o imaginário. Relembrei de seus livros "O Exército de um homem só", "Max e os Felinos" e, certamente, de "O Centauro e o Jardim", entre outros. E claro, de suas sarcásticas crônicas, às segundas feiras, na página 2 do caderno Cotidiano, da Folha de São Paulo.
Encabulado, liguei para a casa dele. Era fim de tarde. Ele estava em meio a uma entrevista e falamos rapidamente. Disse, de saída, a verdade. Era um mero escrevinhador amador de província. Ele respondeu rápido e foi retomar a sua entrevista. Scliar era cobra criada e uma bienal a mais não faria diferença para ele. Para mim, sim, pois estava tratando com um ficcionista do tamanho dos pampas e experiência literária a causar inveja a qualquer escritor latino americano.
Traduzido em espanhol, inglês, alemão, holandês, sueco, francês e hebraico, ganhara prêmios que dariam para tornar célebres muitos escritores. Um escritor para cada prêmio. Os prêmios eram: Joaquim Manoel de Macedo, Érico Veríssimo, Cidade de Porto Alegre, Guimarães Rosa, Brasília, Jaboti(3), Associação Paulista de Críticos de Arte, Casa de Las Américas, em Cuba, Pen Clube do Brasil, e José Lins do Rego. E eu metido com ele. Imaginem a minha perturbação.
Resolvi, de forma audaciosa, mandar um livro meu por Sedex e, após três dias, ligo novamente. Ele ainda não havia recebido. Falei da minha apreensão sobre o nosso então futuro diálogo. Scliar disse que não carecia de me preocupar. E eu tremendo de medo. Chegada a hora consegui fazer a Travessia. Penso que até o afaguei. Dia seguinte, manhã cedo, estava a fazer Cooper e, acidentalmente, encontro com ele. Éramos apenas homens de tênis, calção e camiseta. Nada mais que isso. Conversamos, soltos.
Ontem, domingo, 27, ouço, pelo rádio, que Scliar acabara de morrer. Lamentei e lembrei que sua história pode ser sumariada assim: Seus pais vieram da Besarábia para trabalhar em um projeto de colonização agrícola no interior do Rio Grande do Sul. Ocorreu que o projeto estava no fim e eles mudaram para Porto Alegre, onde Scliar nasceu, em 1937.A família morava no Bom Fim, bairro de imigrantes, e Scliar foi estudar, em 1943, na Escola Iídiche. Em 1948, Scliar é transferido para o Colégio católico Rosário Menino. Depois, formou-se e exerceu a Medicina comunitária. A partir de 68, surge o escritor com "O Carnaval dos Animais" e não parou. Foram quase 80 publicações, entre romances, novelas, contos, ficção juvenil e ensaios. Ontem, 27, ouço pelo rádio que Scliar morrera. Desaparece um grande escritor nacional e fica aberta vaga na Academia Brasileira de Letras. Descanse em paz.
João Soares Neto
Escritor e membro da Academia Cearense de Letras
Fonte: Diário do Nordeste
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