terça-feira, 23 de agosto de 2011

Identidade dá sentido à ação

O tombamento e consequentemente a preservação devem envolver também todo o entorno do equipamento

Ao imaginarmos que um bem será tombado, há a esperança de que ele será recuperado e conservado. A destruição de um equipamento significa mais que a demolição de um prédio, representa a perda de cidadania, de senso de pertencimento à comunidade e da identidade.

Caixas-d´águas do Benfica, inauguradas em 1926, hoje estão obsoletas pelo tempo e pela falta de manutenção
NATINHO RODRIGUES
Uma das estruturas que pode ser recuperada conta a história do abastecimento de água em Fortaleza. Entre o Hospital Instituto Dr. José Frota (IJF) e a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC), as Caixas-d´águas do Benfica, inauguradas em 1926, estão entre os bens que aguardam tombamento pela Prefeitura da Capital.

Com simplicidade e uma saudade notável, o flanelinha Edimilson Leite, 56, diz orgulhoso que seu pai trabalhou na construção do bem. Hoje, o local sofre as consequências do esquecimento. "Passo o dia aqui. Toda vez que eu olho pra elas, lembro do meu pai. Este lugar merecia ser valorizado", destaca.

Para o arquiteto, urbanista e professor da UFC, Marcondes Araújo Lima, identidade é a palavra chave para definir o sentido do tombamento. Mais que preservar, tombar é manter viva a identificação de uma sociedade com o seu patrimônio, com a sua história. Essa preservação deve acontecer não apenas com o bem, mas com todo o entorno, já que, se este for destruído, o equipamento também perderá suas características originais.

"O tombamento deve ocorrer em um contexto amplo e isso está sendo feito tardiamente. No caso dos casarões do Jacarecanga, eles estão descaracterizados, perdendo a sua ambiência. É como salvar um paciente, depois do último fôlego".

Significação
O historiador Erick Assis confirma a afirmação e comenta que o que faz um tombamento valer a pena é a significação dele para a comunidade. "É a sociedade ouvida que vai decidir se o que foi tombado é ou não relevante e isso só vai ser identificado descobrindo o sentido do tombamento para a vida de cada um", diz.

Conforme Marcondes Araújo, os tombamentos deveriam acontecer antes de os equipamentos estarem em uma situação extremamente difícil, correndo sérios riscos de desaparecer. Segundo o especialista, o ideal seria que esta preservação ocorresse quando o bem possuísse vida e não apenas quando a sua "alma" não existisse mais. "A história e a memória estão se perdendo. Os tombamentos representam uma vitória tardia, eles deveriam acontecer no auge da existência destes bens. Mas, já é um gatilho acionado".

Marcondes Araújo enfatiza que inúmeros bens estão próximos de desaparecerem. "É preciso fazer mais. Temos espaços fundamentais para a continuidade da nossa história e memória. São tantos bens que o que é feito parece muito pouco".

Como um dos exemplos citados por Marcondes Araújo está a Chácara Flora, localizada na Rua Marechal Deodoro. O local, segundo ele, merece o tombamento, porém há espaços mais importantes sob o ponto de vista histórico e arquitetônico como as obras de Emilio Hinko, primeiro arquiteto a se estabelecer no Ceará, dentre elas a Base Aérea de Fortaleza. "As prioridades vão se confundindo. Os tombamentos devem se manter atentos à cidade. É preciso uma política de continuidade", diz.

Erick Assis relata que por si só a lei não garante a preservação de um bem. É preciso que aconteça uma conjugação de ações, como fiscalização institucional e individual, políticas públicas e privadas de preservação e de educação patrimonial.

Em processo
Casa de Juvenal Galeno

Caixas-d´águas do Benfica

Escola Jesus, Maria e José

Patrimônio Arquitetônico do bairro Jacarecanga: Bangalô de Aristides Capibaribe, Procuradoria da União do Estado do Ceará, Bangalô Amarelo, Vila Filomeno, Antiga Vacaria do Adriano Martins e Casa do Acrísio

Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro

Capela do Sagrado Coração de Jesus

Sport Club Maguary

5º Batalhão da Polícia Militar

Samba do Zé Bezerra

Casa da R. Franklin Távora, nº 144

Círculo Operário do Montese

Casa antiga da Rua Tereza Cristina

Colégio Militar de Fortaleza

Chácara Flora

Farmácia Oswaldo Cruz

Paisagem Cultural da Sabiaguaba

Paisagem Cultural do Titanzinho

Maracatu

Casa na Rua Floriano Peixoto

Raimundo dos Queijos

5º Batalhão da polícia militar
5º Batalhão da polícia militar
O prédio que abriga hoje o 5° Batalhão da Polícia Militar é um marco na história do órgão em Fortaleza. Sua construção teve uma duração de cerca de quatro anos, sendo inaugurado em 1927, no governo do então Desembargador Moreira da Rocha. Inicialmente, o local serviria para abrigar o Quartel da Força Pública na Praça dos Coelhos (atual Praça José Bonifácio). Somente em maio de 1972, por meio de decreto, o Quartel do 5º BPM foi criado. A unidade era responsável pelo policiamento ostensivo a pé e motorizado da Capital cearense.

Escola Jesus, Maria e José
Escola Jesus, Maria e José
Dedicada, no início, acolher meninos pobres, a Escola Jesus, Maria e José, construída em 1905, neste momento enfrenta dois dos seus maiores desafios: vencer o abandono e conseguir continuar de pé. O local, marcado hoje pelas pichações e depredação, já foi utilizado para abrigar o Serviço de Profilaxia, o Cine Paroquial e o auditório da Rádio Assunção Cearense. A escola, que pertence à Arquidiocese de Fortaleza, tem processo de tombamento aberto no Governo do Estado. Já neste ano, o espaço foi ocupado por cerca de 350 pessoas.

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