domingo, 9 de outubro de 2011

Iphan analisa pedido de patrimônios imateriais

Os três pedidos de registro de patrimônio imaterial são novidades no Ceará, embora previsto por legislação

Grupos juninos do Estado, como a Quadrilha do Zé Testinha, trazem nas suas encenações ritmos como forró, xote, baião e xaxado no repertório musical
BRUNO GOMES
Iguatu. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), no Ceará, analisa três pedidos de registro de preservação de bens culturais de natureza imaterial. São eles: o complexo cultural e religioso de Santo Antônio, em Barbalha; as matrizes tradicionais do forró (xote, baião e xaxado); e a dança do maracatu, na Capital. Ainda não há no Estado nenhum patrimônio cultural imaterial registrado, e o primeiro a alcançar essa condição será a festa do padroeiro de Barbalha, cujo processo está mais avançado e foi apresentado no início de 2010.

Os três pedidos de registro de patrimônio imaterial são novidades no Ceará, embora previsto por legislação desde 2001. Entretanto, se compararmos com o processo de tombamento de bens imóveis e de obras de arte que já dura cerca de 70 anos no Brasil, é uma proteção recente, ainda desconhecida por muitos, mas de fundamental importância para a preservação da cultura nacional popular, que se manifesta em várias comunidades interioranas.

A chefe substituta da divisão técnica do Iphan, no Ceará, Ítala Morais da Silva, evidencia que o processo de tombamento do patrimônio material é mais limitado, com ocorrência em poucas cidades, que apresentam imóveis da época colonial e barroca. "Numa nova perspectiva cultural, o registro visa preservar uma quantidade maior de bens, mesmo de práticas culturais de um só grupo", explicou. "O objetivo é a diversidade cultural, fazendo com que maior número de pessoas possa ser representado em suas manifestações artísticas e culturais".

Ítala Silva explicou que os pedidos de registro de bem cultural de natureza imaterial devem ser apresentados por um maior número de pessoas, entidades e instituições públicas e privadas. Devem ser acompanhado de um histórico da atividade, documentos, fotos, recortes de jornais e de outras mídias - áudio e vídeo. O processo dura em média 18 meses e exige a realização de várias audiências públicas na comunidade e de um inventário por técnicos, como metodologia de trabalho. Trata-se do Inventário Nacional e Referências Culturais (INRC).

"A metodologia de trabalho do registro de um bem imaterial resulta em um processo mais complexo em comparação com o tombamento de um imóvel com a participação de vários técnicos", observa Ítala Silva. "É um trabalho interdisciplinar". Outro aspecto diferencial é que deve haver uma efetiva participação e desejo da comunidade para que ocorra o registro. "A sociedade deve ter participação ativa e um desejo de preservação do bem". Apesar da exigência de envolvimento de um maior número de agentes, o registro do bem imaterial não evita a possibilidade de perda da prática cultural, por não sucessão na comunidade para a geração jovem ou por outros motivos. "Não podemos obrigar que a atividade cultural seja mantida ao longo do tempo. A legislação prevê que, a cada dez anos, o Iphan faça nova pesquisa, um inventário e uma análise para a apresentação de um novo parecer e continuidade do registro".

Após o registro, o Iphan promove uma articulação para a implantação de políticas públicas visando à preservação do bem protegido. "É importante existir o registro para a continuidade dos grupos, pois as pessoas de mais idade, os mestres da cultura, transmitem para os jovens essas práticas", disse Ítala. A partir de uma maior participação da comunidade e sensibilização de seus membros fica mais fácil a preservação do bem cultural. Os pedidos de registro do forró e do maracatu como bem imaterial pelo Iphan foram apresentados neste ano, respectivamente, pela Associação Cearense do Forró, e pela Associação Cultural Maracatu Rei do Congo, e ainda carecem de uma melhor avaliação, segundo Ítala. "Só após apresentação do inventário teremos melhor definição da demanda solicitada", ressaltou. "No caso do maracatu é necessário que o pedido envolva outros grupos, uma participação conjunta por ser um bem coletivo".

Primeiros
O registro de bem cultural imaterial começou a ocorrer a partir de 2001, após publicação de decreto pelo Iphan. Os primeiros registros foram em 2004. Estão protegidos e reconhecidos o ofício das baianas do acarajé, na Bahia, e a arte gráfica dos índios Waiãipi, do Amapá. Desde 2007, que os padrões e cores que constituem o patrimônio iconográfico Kusiwa da cultura Waiãpi está registrado oficialmente no dossiê do Iphan. No Iphan, há um Conselho Consultivo, com representações da sociedade civil e de entidades de classe, que apreciam o dossiê de registro do bem imaterial.

Mais informações

Superintendência do Iphan em Fortaleza
Rua Liberato Barroso, 525, Centro
Telefone: (85) 3221. 6360


SANTO ANTÔNIO

Decisão deve sair este ano

A cidade de Barbalha, na região do Cariri, vive a expectativa de aprovação pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) do registro da Festa de Santo Antônio de Barbalha. Essa será a denominação oficial, conforme decisão coletiva tomada recentemente em audiência pública realizada no Município. "Esperamos que até o fim do ano o Iphan anuncie o registro e publique o dossiê oficial até a realização da próxima festa em 2012", disse o secretário de Cultura e Turismo do Município, Dorivan Amaro dos Santos.

Os agentes culturais do Município esperam com ansiedade a divulgação do registro. A demanda oficial foi encaminhada ao Iphan no início de 2010, mas Santos observa que o inventário das festividades religiosas e populares, que inclui o carregamento do Pau da Bandeira, a Cachaça do Vigário e o novenário em louvor ao santo padroeiro, começou em 2003. "Já houve muitas reuniões, audiências públicas e aguardamos agora o anúncio do registro porque o processo já está concluído", frisou. "Será muito importante para a divulgação, valorização e reconhecimento de uma festa que terá caráter nacional".

Santos observou que o registro da Festa de Santo Antônio de Barbalha vai aumentar a responsabilidade dos moradores, da administração pública municipal e das pessoas envolvidas com a promoção da cultura. "Haverá um maior cuidado com a preservação". A demanda apresentada pelo Município envolveu ampla participação e articulação da comunidade local.

O professor de História da Universidade Regional do Cariri (Urca) e presidente do Instituto Pró-Memória, uma ONG de Barbalha, Josier Ferreira da Silva, ressaltou que historiadores e memorialistas da região do Cariri vivem a expectativa do registro como bem imaterial da Festa de Santo Antônio de Barbalha. "Essa iniciativa vai fortalecer a identidade cultural do Município. Aumenta, por outro lado, a nossa preocupação em preservar a tradição". Josier observou que apesar do mundo moderno globalizado e tecnológico, a região do Cariri cearense preserva manifestações culturais que têm origem com a colonização do sertão cearense a partir de Pernambuco. "Há de conviver o novo e o tradicional em uma região marcada pela diversidade cultural e de seus diversos ritos religiosos populares".

A partir da segunda metade da década de 1976, houve a implantação de políticas públicas de valorização e reconhecimento da Festa de Santo Antônio de Barbalha, quando o Município investiu em divulgação e organização do evento. Ele defende um aprofundamento do inventário sobre as diversas manifestações culturais da região.

O pedido de registro das matrizes tradicionais do forró - xote, baião e xaxado - ainda vai passar por um processo de análise do Iphan. São ritmos de música e de dança que fazem parte da cultura nordestina. Segundo registro de Câmara Cascudo, o xote é antiga dança de salão, provavelmente de origem húngara e que se assemelha à polca. O xaxado é originário do alto sertão pernambucano e divulgada por cangaceiros. O baião é um gênero musical e sertanejo de canto e de dança.

Surgimento
A historiografia registra que foi a partir do encontro na década de 1940, entre o sanfoneiro Luiz Gonzaga, pernambucano de Exu, e o advogado e compositor cearense da cidade de Iguatu, Humberto Teixeira, que surgiu o ritmo baião. A dupla teria então criado esse novo jeito de tocar e dançar músicas conhecidas popularmente de arrasta-pé. Daí a denominação de "Rei do Baião" e "Doutor do Baião" para a dupla que abriu espaço para toda essa manifestação musical que chegou até os dias atuais, mesmo com transformações e introdução de instrumentos elétricos.

O tradicional forró pé de serra resiste ao tempo e as composições de cinco décadas passadas ainda estão presentes no repertório de shows de artistas consagrados. O chamado forró universitário mantém o ritmo do xote (dois pra lá, dois pra cá).

Registrar e preservar essa cultura musical nordestina é um reconhecimento da importância desse gênero, que passou a ser conhecido por forró, e que já está fixado nas mentes e nos corações de gerações seguidas e que resiste aos modismos de cada época.

Mais informações

Prefeitura de Barbalha

Secretaria de Cultura e Turismo
Rua Princesa Izabel, 187, Centro
Telefone: (88) 3532. 1708


Honório Barbosa
Repórter

Nenhum comentário: